A primeira parte pode ser encontrada aqui: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/08/o-dia-em-que-choveu-fogo-primeira-parte.html
Apercebendo-se de que estava a deixar-se dominar pelo pânico, abriu os olhos e forçou-se a respirar normalmente. Arriscou mais um olhar ao céu. Havia bombardeiros enormes, com um motor em cada asa. A acompanhá-los voavam unidades mais pequenas, com uma única hélice e de asas arqueadas.
Apercebendo-se de que estava a deixar-se dominar pelo pânico, abriu os olhos e forçou-se a respirar normalmente. Arriscou mais um olhar ao céu. Havia bombardeiros enormes, com um motor em cada asa. A acompanhá-los voavam unidades mais pequenas, com uma única hélice e de asas arqueadas.
Por
instinto, outra explosão fê-lo encolher-se na sua toca. O ataque
foi sucedido por múltiplos rebentamentos. Concluiu que estavam a
arrasar as linhas defensivas da cidade, das quais fazia parte.
Passara
um mês desde que fora chamado e tanto tinha mudado desde essa
altura. Relembrava-se que fora um jovem cheio de convicções.
Pensara que iria para a guerra para ser coberto de heroísmo e ajudar
a repelir a ofensiva dos malditos Fritzes. Salvaria a cidade e
o seu amor e, no fim, tudo ficaria bem. Infelizmente, a realidade era
muito mais amarga do que os seus piores receios. Haviam-lhe dado
somente uma pá e tivera de cavar valas durante dias a fio. De
soldado não tinha nem treino, nem equipamento. Cobria-o ainda a
roupa esfarrapada com que se apresentara na recruta.
O
coração falhou-lhe uma batida ao pensar na sua querida Nastja.
Desde que a conhecera, em Maio, que a sua vida dera uma volta enorme.
Havia algo nela que o atraía e prendia, como se um véu de mistério
a rodeasse. Tinham partilhado momentos fugazes e intensos. Não
conseguia deixar de corar ao recordar a última noite que tinham
passado juntos. Tinham feito amor naquele velho sótão de madeira
abandonado, a melhor experiência da sua vida. Não queria morrer
ali. Não havia olhar mais belo, nem nome mais bonito que o de
Anastasia. Queria voltar para a sua amada, são e salvo. Desejava
poder, mais uma vez, dormitar no seu regaço. Isso seria a sua maior
felicidade.
Os
pensamentos foram interrompidos pelo deflagrar de mais cargas
explosivas. Encolheu-se ainda mais no buraco, como se isso pudesse
aumentar as suas hipóteses de sobrevivência. Sentia-se impotente.
Seria diferente se ao menos pudesse combater o inimigo cara-a-cara.
Eram cobardes e dependiam das suas máquinas infernais para ganhar
vantagem. De certo que não seriam tão corajosos em terra. Dava tudo
para ter oportunidade de os enfrentar numa luta corpo-a-corpo.
O
clamor de outra explosão fez-se ouvir tão perto que lhe deixou um
zumbido nos ouvidos. Nesse instante, foi coberto com terra e
detritos. Pensou que iria ficar soterrado, mas, felizmente, a
quantidade não fora suficiente para tal. Ao inspirar, as suas vias
respiratórias foram invadidas pela poeira que circulava no ar.
Tossiu violentamente, tentando limpar a garganta. Os olhos
lacrimejavam fortemente. Novas explosões fizeram-se sentir segundos
depois.
Nos
minutos que se seguiram, permaneceu encurvado na trincheira, coberto
de terra. De súbito, tal como tinha começado, o ataque terminou. Os
motores dos aviões e os rebentamentos só se ouviam à distância.
-
Soldados, formar! - ouviu o seu tenente ordenar.
Alexey
abriu os olhos a medo e não viu nenhuma aeronave no ar. Sacudiu a
terra e ramos de tomate seco que se tinham acumulado sobre a sua
cabeça, antes de se levantar e aproximar dos restantes.
Ao
caminhar pelo terreno, deu-se conta das inúmeras crateras deixadas
pelas bombas inimigas. Aqui e ali estavam corpos despedaçados. O
cheiro a queimado infestava o ar. Evitou olhar demais, já que não
queria vomitar o almoço. A bateria anti-aérea sumira e apenas um
buraco com destroços espalhados em volta atestavam a sua existência.
Os aviões alemães continuavam a sobrevoar o céu, fazendo-o
essencialmente sobre a cidade. Sem se demorar mais, juntou-se ao
grupo, permanecendo na última fila e em sentido.
-
Mas que raio! Faltam aqui soldados. Tu aí, sabes contar? Conta-me os
mortos e feridos. Rápido! - comandou o jovem, escolhendo um soldado
da primeira fila.
Alexey
olhou para a farda quase nova do seu tenente. Apesar de sujo, aquele
uniforme assentava perfeitamente naquele corpo cheiinho. A barba rara
denunciava a sua idade e inexperiência. Pertencer a um extracto
superior da sociedade tinha a vantagem de se poder frequentar a
academia militar. Todos tinham de servir a Terra-mãe, a diferença é
que a maioria o fazia como soldados rasos, sem direitos nem regalias.
-
Meu tenente, contei 18 feridos e 14 mortos – reportou o rapaz
receoso.
-
Faltam aqui mais de 50 recrutas! Se eles não estiverem de volta até
ao pôr-do-sol, serão considerados desertores!
O
comandante olhou para os seus soldados. Houve quem prendesse a
respiração, antecipando uma punição severa.
-
Nós somos uma das primeiras linhas de defesa da cidade. Os alemães
estão perto e a qualquer momento poderão chegar à nossa posição.
Em breve chegarão armas e rações, economizem-nas, pois não sei
quando voltaremos a ter mais. Há dúvidas?
Como
resposta, obteve um silêncio pesado.
-
Vamos, soldados! Não vamos deixar que Estalinegrado caia! As nossas
famílias moram ali - exclamou, apontando para a cidade. - Não
podemos deixar que os alemães lhes ponham as mãos em cima. Eles
irão violar as nossas mães e irmãs. Irão matar os nossos pais e
saquear as nossas casas. Querem apoderar-se do nosso país e
reduzir-nos à escravidão.
Este conto continua em: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/08/o-dia-em-que-choveu-fogo-parte-35.html
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