quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Nem mais um passo atrás! - parte 2/3


A primeira parte pode ser encontrada em: http://pedro-cipriano.blogspot.co.uk/2012/08/nem-mais-um-passo-atras-primeira-parte.html

― Cada comandante, soldado e comissário tem que entender que os nossos recursos não são infinitos. O território da União Soviética não é uma vastidão selvagem, pois está povoado por pessoas: trabalhadores, aldeões, intelectuais, os nossos pais e nossas mães, esposas, irmãos e crianças. O território da Rússia capturado pelo inimigo é pão e outros recursos para o exército e cidadãos, ferro e combustível para as indústrias, fábricas que fornecem os militares com equipamento e munições; e também caminhos-de-ferro. Já não temos superioridade sobre o inimigo em recursos e abastecimento de pão. Prosseguir com a retirada significa destruirmos-nos a nós mesmos e à nossa Terra-Mãe. Cada novo pedaço de território que deixamos ao inimigo deixa-os mais fortes e, a nós, às nossas defesas e à nossa Terra-Mãe, mais fracos.
Emocionou-se ligeiramente. O seu próprio filho havia sido capturado pelos Nazis no ano anterior. Não que se sentisse realmente ligado ao seu filho Yakov, somente porque ele era o último traço da única mulher que Ioseb alguma vez amara.
Pensou como sentia a falta de Ekaterina. Perguntava-se sobre o porquê duma morte tão prematura. Após o casamento, haviam tido somente quatro anos juntos, antes de ela morrer de tifo. Os momentos que partilharam foram tão felizes como efémeros. Ioseb não conseguia ficar indiferente àquelas memórias.
Infelizmente, o filho que ela deixara no mundo não era um exemplo para ninguém. Era absolutamente humilhante relembrar o dia em que se tentara suicidar devido a um desentendimento com um rabo de saias. Nem tão pouco conseguira apontar correctamente a pistola, de modo que falhara. Pior que esse episódio era o facto de se ter deixado capturar vivo pelos alemães.
Não podia deixar-se amolecer com aqueles sentimentos nostálgicos. Também ele estivera preso em campos de concentração por três vezes, sendo libertado somente numa delas; nas outras duas, conseguira escapar pelos seus próprios meios. Yakov era um inútil, concluiu, e um traidor por se deixar capturar tão facilmente pelos Nazis. Deveria ter lutado até a morte como qualquer soldado russo que amasse a Terra-Mãe. Envergonhava-o o facto de ter um filho assim. Como pai, não fora fácil, no entanto, já há meses que tinha tomado a decisão de rejeitar todas as propostas de troca por outros prisioneiros. Não iria ter um tratamento preferencial só por ser seu filho.
Ioseb voltou ao discurso, já tinha um lema na cabeça para dar vida a esta ordem. Sabia que não seria a primeira pessoa a usar essas palavras, no entanto, cabia-lhe usá-las novamente para inspirar o povo russo, como outros líderes já haviam feito com os seus povos. Acrescentou as duas linhas no texto, lançando um slogan:
― A conclusão é que é a altura para parar de fugir. Nem mais um passo atrás! Este será o nosso lema daqui em diante.
Ele sabia que teria de aproveitar o lema que acabara de introduzir e, por isso, modificou o texto que vinha no parágrafo seguinte.
― Temos de proteger cada fortaleza, teimosamente cada metro de solo Soviético, até à última gota de sangue; agarrar cada peça do nosso solo e defendê-lo enquanto for possível. A nossa Terra-Mãe irá passar tempos difíceis. Temos que os parar e, depois, mandá-los de volta e destruir o inimigo a qualquer custo. Os alemães não são tão fortes como os vendilhões de pânico dizem. Eles estão a esticar a sua força ao limite. Aguentar o seu golpe agora significa assegurar a vitória no futuro.
Ioseb ainda se lembrava do plano original para submeter completamente a Europa: apoiar diplomaticamente os alemães, encorajando-os para uma guerra. Os banqueiros ingleses e americanos estavam a agir do mesmo modo, apoiando a Alemanha economicamente. A Rússia fizera o melhor que podia ter fazer naquele ponto: manter-se neutra. Eventualmente, quando reunissem as condições necessárias, os Nazis iriam querer vingar-se da derrota que haviam sofrido na guerra anterior, atacando a França, Polónia e talvez o Reino Unido.
O plano era deixar os europeus lutarem entre si até estarem completamente esgotados e, no fim, atacaria a Alemanha e ocuparia esses países. A Rússia seria vista como arauto da paz e a salvadora da tirania Nazi e, provavelmente, poderia ocupar efectivamente esses países ou, pelo menos, torná-los estados semi-dependentes. Era a maneira mais fácil de expandir a esfera de influência da União Soviética e espalhar os ideias do comunismo, que eram, sem dúvida, melhores que o paradigma do capitalismo.
Claramente tinha subestimado a intuição de Hitler pois, de algum modo, ele tinha previsto o seu plano e antecipado uma resposta, atacando a União Soviética duma forma inesperada.
Os alemães não haviam feito muito esforço para esconder as preparações para o ataque, o que lhe fez crer que era apenas mais uma jogada política para conseguir a cedência de alguns territórios nos países de leste. O voo de Rudolf Hess para o Reino Unido só fazia com que a suspeita duma conspiração Germano-Britânica contra a Rússia ganhasse força na sua cabeça. O facto do embaixador alemão em Moscovo ter revelado os planos de Hitler uns dias antes só fez com que a situação parecesse cada vez mais uma conspiração. Chegou ao ponto de ele ter explodido de raiva, declarando que a desinformação chegara ao nível dos embaixadores. Até ao último momento, não considerara a hipótese duma invasão alemã, e ficara com receio de provocar a Alemanha, porque sabia que ainda era muito cedo para a Rússia a desafiar.
 
A terceira parte está disponível em: http://pedro-cipriano.blogspot.co.uk/2012/08/nem-mais-um-passo-atras-terceira-e.html

Este capítulo foi retirado do primeiro livro da trilogia de Estalinegrado, porque não estava relacionado directamente com as personagens principais. Apenas o publico aqui num exercício de pesquisa e ambientação do resto do livro.

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