sexta-feira, 4 de maio de 2012

Ensaio sobre o futuro de Portugal, do seu povo e da sua cultura - parte 2/7

A primeira parte está disponível em: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/05/ensaio-sobre-o-futuro-de-portugal-do.html

Economia


Muito se fala e se escreve sobre a crise, sendo que a comunicação social não nos deixa esquecê-la nem por um momento. Embora muitos expressem a opinião de que a crise que atravessamos seja mais de valores morais do que económicos, eu irei por agora apenas focar-me nos segundos.
A 24 de Outubro de 1929, a Quinta-Feira Negra foi um ponto de viragem. A queda brusca do valor das acções da bolsa de Nova Iorque desencadeou a maior crise económica do século XX. Os mercados entraram num ciclo vicioso colapsando por completo nos dias seguintes. Muitas empresas foram forçadas a fechar portas por via de o seu capital ter literalmente desaparecido numa questão de horas. Seguiu-se uma grande inflação, quebrando ainda mais o consumo e levando milhares ao desemprego. A principal causa deste colapso foi o completo desajuste entre a produção e o consumo, que já se fazia sentir há alguns meses através de uma recessão moderada.
Essa crise propagou-se pelo mundo inteiro, afectando a maioria de todos os países. A recessão daí derivada durou vários anos. Afectando os país consoante o seu grau de dependência dos países capitalistas. Nalguns, colocou no poder e fortaleceu a posição de partidos extremistas que, com discursos populistas, conseguiram o apoio da população. Alguns desses regimes duraram décadas, causando uma estagnação intelectual, uma corrupção dos valores morais, uma degradação da qualidade de vida, culminando no desrespeito pelos direitos humanos. É inegável a responsabilidade desses mesmos regimes comunistas, fascistas e nazistas no escalar do segundo conflito mundial.
Ironicamente, com o começo da guerra, os efeitos da crise foram-se desvanecendo até desaparecerem por completo. A razão para tal era simples, pois o efeito infinitamente destrutivo da guerra balanceara o desequilíbrio entre a produção e o consumo. Durante o crescimento económico espectacular dos anos vinte tal crise era inconcebível, contudo os erros dos passado ajudam-nos a perceber as tendências do futuro. O actual sistema económico gere-se por períodos cíclicos de crescimento e recessão.
O sistema económico actual prevê e necessita de um crescimento continuo e acelerado devido às regras impostas pelas mecânicas modernas de criação e movimento de dinheiro, um ritmo exponencial segundo a matemática. Os empréstimos são o melhor espelho desse mesmo crescimento. Num planeta de recursos finitos isso simplesmente não é possível, traduzindo-se na prática em recessões cíclicas seguidas de recuperação. Uma das maneiras de impedir que isso aconteça é equilibrando a balança do consumo com a da produção. Uma primeira aproximação seria limitar a produção de certos bens de modo a que só o fossem à medida que o mercado os conseguisse escoar. Contudo, essa alternativa não é compatível com o desejo de crescimento exponencial. Quando chega a altura de aprovar as leis, é notório o peso que lobbys com grande volume de capital têm nesse processo. No plano prático, só resta aumentar o consumo, sendo o método mais comum o da publicidade. Todavia, é fácil de adivinhar que nem mesmo a publicidade mais perfeita pode aumentar indefinidamente o consumo, pois a certa altura deixa de haver potenciais clientes com meios para compra-los. A segunda alternativa é a expansão do mercado através da globalização económica que, mais uma vez face ao tamanho finito do nosso planeta, sabemos que não é uma solução viável a longo prazo. As crescentes pressões para a privatização de certos sectores chave da economia são um reflexo disso mesmo. A terceira alternativa é a destruição intencional do produto, método usado durante os primeiros meses da grande depressão dos anos trinta, quando os produtores tentavam em vão aumentar os preços dos seus produtos. Outro método é o da obsolescência programada, uma tendência seguida pelos produtores tecnológicos, em que um equipamento é desenhado de tal modo que, ao fim de alguns anos, se torna obsoleto e tem de ser substituído. Todavia, a maneira mais fácil de realizar este equilíbrio é através de uma destruição massiva, ou seja uma guerra, pois nenhuma outra actividade humana consegue sorver tão grande quantidade de material e mão-de-obra de uma forma tão eficiente.
Pela análise dos ciclos de Kondratiev, que tentam modelar os ritmos de recessão e recuperação global a longo termo, anteriormente descritos, sabemos que estamos numa recessão, caminhando a passos largos para outra crise. No topo disso, há a ameaça do fim do petróleo barato, pelo qual já se iniciaram algumas agressões armadas da parte do Ocidente contra o Médio Oriente. A crise energética está deste modo intimamente ligada à crise económica.
O problema da regulação da economia não é novo nem puramente académico. Numerosas soluções foram já propostas, contudo, a ganância de uma elite previne que estas possam efectivamente ser aplicadas. O poder instituído faz-nos crer que uma economia e moeda globais são a solução para a crise. No entanto, É notório que isso apenas servirá para aumentar o fluxo de riqueza para aqueles que já são ricos, sem que isso melhore em nada a vida dos restantes. Tendemos perigosamente para os ricos ficarem cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Um exemplo actual é o caso da União Europeia, em que os estados membros são obrigados a importar produtos que podiam produzir por si mesmos, fazendo com que a sua dívida externa cresça sem parar. As pessoas são obrigadas a aceitar empregos que não querem para pagar os empréstimos que contraíram. Certos países estão lentamente a tornar-se fonte de mão-de-obra barata para outros mais ricos, inclusive dentro da Europa. Os pobres são mantidos pobres para, através do medo, impedirem a classe média de se libertar desta prisão laboral. Em suma, esse ultra-neoliberalismo económico é a escravatura do século XXI.
Na outra ponta da mesa há a economia e moeda locais, prevendo que a riqueza de uma dada comunidade se mantenha relativamente constante, limitando o fluxo de produtos entre comunidades ao mínimo essencial, sendo exactamente o oposto da economia global, na qual se promove um fluxo contínuo de todo o tipo de bens. Projectos promissores foram iniciados em várias cidades europeias e, felizmente, Portugal não se deixou ficar atrás. Apesar de ainda ser quase que uma miragem, se houve dedicação, esforço e essencialmente vontade, poderá ser uma solução viável para os problemas económicos do próximo século. A mudança acontecera quando as pessoas tomarem consciência de que a economia é um jogo que não são obrigadas a jogar.
A questão-chave que se coloca é se continuará Portugal, durante o próximo século, a contribuir para o hiato entre ricos e pobres ou se, por outro lado, será um exemplo na construção de uma economia mais justa e humana

Nenhum comentário:

Postar um comentário