Economia
Muito
se fala e se escreve sobre a crise, sendo que a comunicação social
não nos deixa esquecê-la nem por um momento. Embora muitos
expressem a opinião de que a crise que atravessamos seja mais de
valores morais do que económicos, eu irei por agora apenas focar-me
nos segundos.
A
24 de Outubro de 1929, a Quinta-Feira Negra foi um ponto de viragem.
A queda brusca do valor das acções da bolsa de Nova Iorque
desencadeou a maior crise económica do século XX. Os mercados
entraram num ciclo vicioso colapsando por completo nos dias
seguintes. Muitas empresas foram forçadas a fechar portas por via de
o seu capital ter literalmente desaparecido numa questão de horas.
Seguiu-se uma grande inflação, quebrando ainda mais o consumo e
levando milhares ao desemprego. A principal causa deste colapso foi o
completo desajuste entre a produção e o consumo, que já se fazia
sentir há alguns meses através de uma recessão moderada.
Essa
crise propagou-se pelo mundo inteiro, afectando a maioria de todos os
países. A recessão daí derivada durou vários anos. Afectando os
país consoante o seu grau de dependência dos países capitalistas.
Nalguns, colocou no poder e fortaleceu a
posição de partidos extremistas que, com discursos populistas,
conseguiram o apoio da população. Alguns desses regimes
duraram décadas, causando uma estagnação intelectual, uma
corrupção dos valores morais, uma degradação da qualidade de
vida, culminando no desrespeito pelos direitos humanos. É inegável
a responsabilidade desses mesmos regimes comunistas, fascistas e
nazistas no escalar do segundo conflito mundial.
Ironicamente,
com o começo da guerra, os efeitos da crise foram-se desvanecendo
até desaparecerem por completo. A razão para tal era simples, pois
o efeito infinitamente destrutivo da guerra balanceara o
desequilíbrio entre a produção e o consumo. Durante
o crescimento económico espectacular dos anos vinte tal crise era
inconcebível, contudo os erros dos passado ajudam-nos a perceber as
tendências do futuro. O actual sistema económico gere-se por
períodos cíclicos de crescimento e recessão.
O
sistema económico actual prevê e necessita de um crescimento
continuo e acelerado devido às regras impostas pelas mecânicas
modernas de criação e movimento de dinheiro, um ritmo exponencial
segundo a matemática. Os empréstimos são o melhor espelho desse
mesmo crescimento. Num planeta de recursos finitos isso simplesmente
não é possível, traduzindo-se na prática em recessões cíclicas
seguidas de recuperação. Uma das maneiras de impedir que isso
aconteça é equilibrando a balança do consumo com a da produção.
Uma primeira aproximação seria limitar a produção de certos bens
de modo a que só o fossem à medida que o mercado os conseguisse
escoar. Contudo, essa alternativa não é compatível com o desejo de
crescimento exponencial. Quando chega a altura de aprovar as leis, é
notório o peso que lobbys com grande volume de capital têm
nesse processo. No plano prático, só resta aumentar o consumo,
sendo o método mais comum o da publicidade. Todavia, é fácil de
adivinhar que nem mesmo a publicidade mais perfeita pode aumentar
indefinidamente o consumo, pois a certa altura deixa de haver
potenciais clientes com meios para compra-los. A segunda alternativa
é a expansão do mercado através da globalização económica que,
mais uma vez face ao tamanho finito do nosso planeta, sabemos que não
é uma solução viável a longo prazo. As crescentes pressões para
a privatização de certos sectores chave da economia são um reflexo
disso mesmo. A terceira alternativa é a destruição intencional do
produto, método usado durante os primeiros meses da grande depressão
dos anos trinta, quando os produtores tentavam em vão aumentar os
preços dos seus produtos. Outro método é o da obsolescência
programada, uma tendência seguida pelos produtores tecnológicos, em
que um equipamento é desenhado de tal modo que, ao fim de alguns
anos, se torna obsoleto e tem de ser substituído. Todavia, a maneira
mais fácil de realizar este equilíbrio é através de uma
destruição massiva, ou seja uma guerra, pois nenhuma outra
actividade humana consegue sorver tão grande quantidade de material
e mão-de-obra de uma forma tão eficiente.
Pela
análise dos ciclos de Kondratiev, que tentam modelar os ritmos de
recessão e recuperação global a longo termo, anteriormente
descritos, sabemos que estamos numa recessão, caminhando a passos
largos para outra crise. No topo disso, há a ameaça do fim do
petróleo barato, pelo qual já se iniciaram algumas agressões
armadas da parte do Ocidente contra o Médio Oriente. A crise
energética está deste modo intimamente ligada
à crise económica.
O
problema da regulação da economia não é novo nem puramente
académico. Numerosas soluções foram já propostas, contudo, a
ganância
de uma elite previne que estas possam efectivamente ser aplicadas. O
poder instituído faz-nos crer que uma economia e moeda globais são
a solução para a crise. No entanto, É notório que isso apenas
servirá para aumentar o fluxo de riqueza para aqueles que já são
ricos, sem que isso melhore em nada a vida dos restantes. Tendemos
perigosamente para os ricos ficarem cada vez mais ricos e os pobres
cada vez mais pobres. Um exemplo actual é o caso da União
Europeia, em que os estados membros são obrigados a importar
produtos que podiam produzir por si mesmos, fazendo com que a sua
dívida externa cresça sem parar. As pessoas são obrigadas a
aceitar empregos que não querem para pagar os empréstimos que
contraíram. Certos países estão lentamente a tornar-se fonte de
mão-de-obra barata para outros mais ricos, inclusive dentro da
Europa. Os pobres são mantidos pobres para, através do medo,
impedirem a classe média de se libertar desta prisão laboral. Em
suma, esse ultra-neoliberalismo económico é a escravatura do século
XXI.
Na
outra ponta da mesa há a economia e moeda locais, prevendo que a
riqueza de uma dada comunidade se mantenha relativamente constante,
limitando o fluxo de produtos entre comunidades ao mínimo essencial,
sendo exactamente o oposto da economia global, na qual se promove um
fluxo contínuo de todo o tipo de bens. Projectos promissores foram
iniciados em várias cidades europeias e, felizmente, Portugal não
se deixou ficar atrás. Apesar de ainda ser quase que uma miragem, se
houve dedicação, esforço e essencialmente
vontade, poderá ser uma solução viável para os problemas
económicos do próximo século. A mudança acontecera quando as
pessoas tomarem consciência de que a economia é um jogo que não
são obrigadas a jogar.
A
questão-chave que se coloca é se continuará Portugal, durante o
próximo século, a contribuir para o hiato entre ricos e pobres ou
se, por outro lado, será um exemplo na construção de uma economia
mais justa e humana
A terceira parte pode ser encontrada em: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/05/ensaio-sobre-o-futuro-de-portugal-do_05.html
Este pequeno ensaio foi escrito e publicado no nono volume da revista Nova Águia.
http://novaaguia.blogspot.de/
Um excerto foi comentado em: http://movv.org/2012/07/12/pedro-cipriano-o-sistema-economico-atual-preve-e-necessita-de-um-crescimento-continuo-e-acelerado-devido-as-regras-impostas-pelas-mecanicas-modernas-de-criacao-e-movimento-de-dinheiro-um-ritmo-exp/
http://movv.org/2012/09/06/pedro-cipriano-a-europa-mesmo-a-dita-rica-comeca-lentamente-a-redescobrir-lentamente-a-necessidade-de-tornar-a-produzir-aquilo-que-os-economistas-do-sistema-lhe-disseram-ser-inco/#comment-138230
Nenhum comentário:
Postar um comentário