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A musa
Nós somos como arrendatários de uma quinta que cortam a cerca para lenha quando deveríamos usar as fontes infinitas da natureza – o sol, o vento e as marés.
Thomas Edison
Walter acordou quando os primeiros raios de sol entraram pela janela. Um sorriso aflorou-lhe nos lábios quando sentiu a mão de Eva sobre o seu peito. O sorriso cresceu ao relembrar a noite fantástica que havia tido com a criada.
Com cuidado, afastou o braço dela e levantou-se. Ao afastar os lençóis, não pôde evitar apreciar a forma esbelta da jovem. Sentindo crescer dentro de si um desejo intenso, resistiu à tentação de a acordar, pois não queria chegar atrasado. Pé ante pé, aproximou-se do guarda-fatos e retirou um dos uniformes de inventor que lhe fora dado. Assim que vestiu as calças, apercebeu-se que ela despertara.
– Bom dia – cumprimentou, olhando-a com um sorriso.
Havia algo nela que o empolgava. Pensara no assunto várias vezes e chegara à conclusão que só podia ser alguma coisa relacionada com a personalidade. Desde o primeiro dia, em que a rapariga fora encarregada de lhe trazer as refeições, que sentira uma atracção irresistível. Ela tinha apenas dezassete anos contudo, a nível psicológico, parecia muito mais madura. Os sentimentos pareciam ser mútuos, de modo que a relação evoluiu rapidamente para um nível mais sério. Uma ou duas vezes por semana, passavam a noite juntos.
Eva ergueu-se, expondo sensualmente os seus seios, numa atitude de clara provocação. Respondeu-lhe à saudação, enquanto passava a mão pela pele morena do seu tronco. Walter não sabia qual a razão para ela assumir um comportamento tão atrevido, todavia, ele adorava.
– Tenho que sair rapidamente. Preciso de inspeccionar os trabalhos antes de falar ao concílio – explicou o inventor, apertando os botões da camisa.
– É pena – comentou a criada, assumindo uma pose erótica e passando a mão pelos seios – Caso contrário, poderíamos brincar mais um pouco.
– Desculpa, eu gostava muito, mas tenho mesmo de ir. O que é que fazes logo à noite? – convidou, vestindo o casaco.
– Não sei... – murmurou Eva, fingindo hesitar – Depende do que tu quiseres.
Walter sentiu o corpo reagir involuntariamente quando ela passou o dedo pelos lábios.
– Sabes bem o que eu quero. Agora tenho mesmo de ir. Até logo – despediu-se, abrindo a porta.
– Espera! – ordenou-lhe, saindo da cama inesperadamente.
O beijo foi breve, todavia suficiente para lhe deixar um sabor adocicado na boca, uma sensação que normalmente o acompanhava durante uma grande parte do dia.
Quando se separaram, ele fechou cuidadosamente a porta e entrou na porta seguinte, a poucos passos. Ainda estava instalado no mesmo quarto onde o haviam colocado no primeiro dia. Como não havia uma academia de ciências no castro, um salão adjacente havia sido convertido num laboratório, onde Walter poderia testar os protótipos antes de os aplicar na realidade.
À excepção de uma fina camada de pó, as mesas estavam quase vazias, já que os experimentos falhados empilhavam-se nas prateleiras e os que haviam sido bem-sucedidos estavam instalados no terreno. Walter enfiou o molho de folhas amarelas na sua pasta de couro e, com ela debaixo do braço, saiu e voltou a trancar a porta. Abandonou o palácio pela escada de serviço, vendo-se em poucos segundos rodeado pelo movimento intenso daquela hora matinal.
Durante os últimos seis meses, pudera seguir uma rotina, como sempre fizera e tanto gostava. Esta só havia sido perturbada duas vezes: a primeira acontecera quando os seus companheiros de expedição tentaram fugir, a segunda fora quando teve de apresentar os resultados obtidos ao fim dos três primeiros meses.
A execução dos que o acompanhavam ainda lhe causava arrepios pela violência e crueldade com que fora posta em prática. Não tivera outra escolha que não fosse assistir ao cumprimento da pena. Tivera de apelar a todo o seu auto-controlo para não reagir, enquanto os seus conterrâneos eram espancados até à morte. Isso quebrara a ligação à sua vida anterior e ele tinha quase a certeza que fora orquestrado por Artur. Porém, sem provas, o melhor era manter-se em silêncio.
Apesar do nervosismo, os seus resultados haviam sido bem recebidos há três meses atrás. Pouco mais tinha do que alguns projectos e um par de protótipos funcionais. O forte dos assessores não era a ciência e, com alguma complacência de Artur, conseguira ser bem recebido. Todavia, eles haviam exigido uma aplicação prática ao fim de meio ano. Para tal, disponibilizaram-lhe uma equipa de trabalhadores e técnicos, dando-lhe igualmente liberdade total em termos de materiais a usar e de onde iria aplicar as suas criações. Prometeram-lhe também que lhe dariam a liberdade assim que fosse bem sucedido. Dentro de duas horas teria de apresentar os seus resultados e, depois de tão grande investimento, não esperava que lhe facilitassem a vida.
A sétima parte pode ser encontrada em: http://pedro-cipriano.blogspot.de/2012/07/o-monstro-e-musa-setima-parte.html
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