Humberto estava nervoso. Impaciente, esperava que os engenheiros a abrissem, relembrando a sua chegada à Ibéria duas semanas antes. Naquelas terras selvagens havia caminhado durante quatro dias antes de o grupo encontrar a cidade. Muitas expedições haviam passado por ali no entanto, nenhuma havia investigado a vegetação a fundo.
Os especialistas obrigaram-no a recuar. Iriam usar o último recurso para abrir a porta blindada.
O entusiasmo inicial havia-se desfeito quando encontraram as ruínas dos subúrbios. A metrópole havia sido varrida por uma explosão termo-nuclear e volvidos cinco séculos, somente os restos das fundações poderiam interessar aos escavadores de relíquias inúteis. Para um cientista curioso como Humberto, não havia ali nada de interesse. Apesar da desmotivação geral, a desmatação prosseguiu. No meio da pequena selva havia algumas estruturas que haviam resistido à passagem dos séculos. Mas, nem mesmo nos edifícios menos danificados havia algo que pagasse o salário diário de um soldado. A sorte mudou quando um grupo de soldados, que procurava um sítio mais abrigado para dormir, encontrou a cave.
O portão aguentara os assaltos dos técnicos durante toda a manhã. Só quando o sol já atravessara o zénite é que o conseguiram remover, com recurso a explosivos.
Ainda o pó pairava quando Humberto ignorou as convenções de segurança e penetrara no interior da casamanta. Outros o seguiram e cedo descobriram que teriam de proteger as vias respiratórias com as camisolas sob o risco de sufocar com poeira. Com os olhos a lacrimejar, atravessou a entrada que dava para um longo corredor. Parou, tentando lidar com a desilusão. Parecia ser apenas uma estrutura militar do último conflito mundial.
O cientista relembrou o que havia aprendido sobre a Terceira Guerra Mundial. A opinião geral colocava-a como a pior coisa que acontecera à humanidade desde o seu Génesis. Quase uma década de combates contínuos e sangrentos culminaram numa breve guerra atómica. O Verão nuclear queimou grande parte da superfície, matando mais de cinco biliões de seres humanos. O Inverno artificial matou quatro em cada cinco pessoas durante o primeiro ano. A escuridão fora a maior prova da capacidade de adaptação e sobrevivência do homo sapiens sapiens. As trevas duraram mais 70 anos e a noite parcial mais de um século. Não se sabe muito sobre esses anos e ainda menos sobre o que existia antes.
A estrutura era mais extensa do que à primeira vista parecia. Prolongava-se por várias dezenas de metros de corredores labirínticos e tinha pelo menos outros dois níveis.
– Venham ver isto! À sério, larguem tudo o que estão a fazer e venham ver isto! – chamaram, enquanto Humberto examinava uma divisão destinada ao alojamento.
– O que foi? – gritam da outra extremidade, criando um eco surreal.
– Estás bem? – ouviu-se um arqueólogo perguntar.
A situação deixou-o curioso. Ainda confuso com a direcção pouco clara do som, Humberto encaminhou-se para onde a origem lhe pareceu ser mais provável. Uns metros encontrou-se com um dos colegas e no fim bastou seguir a pequena multidão que se acumulara à entrada.
Ar seco e rarefeito fluía do estranho compartimento. Os murmúrios subiram gradualmente de tom. Como todos pareciam estar com medo de entrar, Humberto furou pelo entre os colegas e estacou à entrada.
Os seus olhos depararam-se com uma biblioteca. Uma sala quadrangular, com o comprimento duma carruagem de locomotiva. Estava repleta de prateleiras de livros. Era, provavelmente, a maior que havia sido encontrada durante as duas últimas duas décadas. Os olhos de Humberto maravilharam-se com a descoberta, ao imaginar o conhecimento fantástico que podia ser obtido.
Assim que recuperaram do espanto inicial, os cientistas e arqueólogos organizaram-se de um modo sistemático. Impulsionados pela descoberta, iniciaram de imediato o registo e triagem dos volumes que, para o cientista de meia-idade, eram o maior tesouro do passado. Com eles podiam reproduzir as invenções do passado tendo em conta a restrições tecnológicas.
Foi numa dessas sessões que ele encontrou algo que não estava à espera. Era um manual universitário. Folheou-o casualmente e começou a ler um parágrafo ao acaso. O coração parou por um momento. Piscou os olhos e releu novamente. Avançou algumas páginas e recuou o dobro. Tudo parecia bater certo. Estremeceu ao tomar consciência do poder que aquele feixe de papel encerrava.
Estacou com o livro na mão. A tecnologia que tinha em mãos era proibida e arriscava a pena a morte. Ponderou se valeria a pena arriscar a vida para o mundo ter a possibilidade de entrar numa nova era dourada. Sabia que o livro seria destruído assim que os outros o encontrassem. Por impulso, decidiu guardar a decisão para mais tarde, enfiando o livro na sua mala.
A segunda parte deste conto está disponível em: http://pedro-cipriano.blogspot.pt/2012/12/o-fruto-proibido-parte-22.html
Este conto foi publicado na Nanozine 7: http://nanoezine.wordpress.com/
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