segunda-feira, 30 de março de 2015

Ebooks: Timekeeper

Mais um pedaço do universo criado por Anton Stark é revelado neste conto.


Autor: Anton Stark
Sinopse: Tick-tock. The Timekeeper scavenges, in search of remembrance. There was a time when he was no Timekeeper. There was a time when he was a man called Derkan, with a wife and a son. That man died, and the city of Günn along with him. Tick-tock. The Timekeeper scavenges, and remembers. This is a tale about time, about memory, about the end of things. Tick-tock.


A ambientação foi a vertente mais bem conseguida, invocando uma civilização decadente com uma verosimilhança notável. A personagem principal está muito bem explorada e não tem nada de uni-dimensional. Os pedaços do passado foram muito bem introduzidos na narrativa. A acção desenvolve-se a um bom ritmo e é uma leitura agradável. O único ponto menos positivo foi o facto do início ser um bocado confuso, porque ainda não nos habituamos ao universo.
Recomendo a quem gostar de ler o melhor que os autores portugueses escrevem em inglês.

Classificação: 4 estrelas

domingo, 29 de março de 2015

Chá de Domingo #36: Camp Nanowrimo - Abril de 2015

Preparados para mais um Camp Nanowrimo?


Este Abril decidi participar no Camp Nanowrimo com o objectivo de terminar o meu romance distopico O Canto do Rouxinol. Este manuscrito teve uma relação avessa com os Nanowrimos e Camp Nanowrimos. É a terceira vez que participa no Camp Nanowrimo (Abril de 2013, Julho de 2013 e Abril de 2015). Tentei terminá-lo tambem em dois Nanowrimos (2013 e 2014) sempre sem sucesso. Poderiamos dizer que estava amaldiçoado mas, como não acredito nessas coisas, vou apenas dizer que o esforço e tempo não foram os suficientes. Podem saber o resto da história aqui.

A meta são as simpáticas 30000 palavras, ou seja 1000 por dia. Deve ser mais que suficiente para terminar o livro. Isto significa cerca de 2 horas por dias a escrever.

Aqui fica o link para o manuscrito no site oficial do Camp Nanowrimo.

Mais alguém vai participar?

sexta-feira, 27 de março de 2015

Ebooks: Uma Caligrafia de Violência

Nuno Almeida é um jovem autor português, vale a pena ler um dos seus primeiros contos.


Autor: Nuno Almeida
Sinopse: Lux decidiu escrever a sua ignóbil obra de destruição com o seu sangue e na sua pele.


Escrito num tom mais sombrio do que estamos habituados em relação ao autor. A personagem falha em conseguir criar empatia com o leitor por falta de motivações da mesma e o universo ficcional não está bem estabelecido. Contudo, o final pode causar um arrepio. A ideia está muito interessante. A acção, apesar de se centrar num momento, está bem estruturado e é desenvolvida sem arrastar.
Recomendo a quem queria conhecer uma faceta mais sombria do autor.

Classificação: 3 estrelas

quarta-feira, 25 de março de 2015

Ebooks: Abraça-me para Sempre

Um conto de Carla Ribeiro no Fantasy and Co.


Autora: Carla Ribeiro
Sinopse: Perseguidos por um poder superior, dois irmãos esperam a libertação. Kari e Alecs decidem permanecer juntos até ao fim.



É uma história bonita que vale a pena ler. A autora manteve o registo que lhe é característico. Este conto deixa algumas perguntas por responder. Beneficiaria de uma melhor ambientação e explicação da situação. O desenvolvimento é um tanto lento, mas compreende-se o porquê de ter sido assim.
Recomendo.

Classificação: 3 estrelas

segunda-feira, 23 de março de 2015

Ebooks: Mapmaker

Outro conto do universo ficcional criado por Anton Stark.


Autor: Anton Stark
Sinopse: Patiently, the mapmaker sat atop his tower and observed. Come, sit. Observe, as the mapmaker did. Read and enjoy this short piece on the fundamental difference between imagination and reality.


Este pequeno conto deixou-me um impressão bastante forte. Não só temos pedaços importantes do worldbuilding introduzidos de uma maneira conveniente como não podemos deixar de sentir empatia pela personagem principal. Na minha opinião, deve ser entendido como uma alegoria, visto que não fica esclarecido quem é que alimenta o fazedor de mapas ou como é que ele sustenta. Por outro lado, parece-me pouco verossímil que uma civilização decadente como a que é descrita no conto se possa dar ao luxo de ter um fazedor de mapas.
Recomendo!

Classificação: 4 estrelas

domingo, 22 de março de 2015

Chá de Domingo #35: Hero's Journey / Monomyth

Hoje vou pegar em algo que muita gente já notou em livros e filmes, mas nunca conseguiu dar-lhe um nome.


Quem já viu Star Wars, Senhor do Anéis, Harry Potter? Quase todos nós! Apesar dos mundos serem diferentes e as histórias serem aparentemente distintas, damo-nos de conta de uma certa semelhança entre elas. Mesmo outros filmes, uns mais e outros menos conhecidos são construídos sobre o mesmo template. Este molde chama-se Monomyth ou a Jornada do Herói, a qual se ilustra na imagem abaixo:


Este molde é também usado em histórias míticas, como, por exemplo, a de Jesus Cristo ou a dos heróis gregos. Esta estrutura também está presente na literatura. Um exemplo notável é Moby Dick de Melville. No entanto, os trabalhos de Charles Dickens, Faulkner, Maugham, J. D. Salinger, Hemingway, Jane Eyre, Mark Twain, W. B. Yeats, C. S. Lewis, Seamus Heaney e Stephen King também encaixam perfeitamente neste paradigma.


O Monomyth segue a seguinte estrutura:
  1.  Mundo Comum - O mundo normal do herói antes da história começar.
  2.  O Chamamento para  a Aventura - O herói é confrontado com um problema, um desafio ou uma aventura.
  3.  Reticência do Herói ou Recusa do Chamamento - O herói recusa ou demora a aceitar o desafio ou aventura, geralmente porque tem medo.
  4.  Encontro com o Mentor ou Ajuda Sobrenatural - O herói encontra um mentor que o faz aceitar o chamado e o informa e treina para sua aventura.
  5.  Cruzamento do Primeiro Portal - O herói abandona o mundo comum para entrar no mundo especial ou mágico.
  6.  Provações, aliados e inimigos ou A Barriga da Baleia - O herói enfrenta testes, encontra aliados e enfrenta inimigos, de forma que aprende as regras do mundo especial.
  7.  Aproximação - O herói tem êxitos durante as provações
  8.  Provação difícil ou traumática - A maior crise da aventura, de vida ou morte.
  9.  Recompensa - O herói enfrentou a morte, se sobrepõe ao seu medo e agora ganha uma recompensa (o elixir).
  10.  O Caminho de Volta - O herói deve voltar para o mundo comum.
  11.  Ressurreição do Herói - Outro teste no qual o herói enfrenta a morte, e deve usar tudo que foi aprendido.
  12.  Regresso com o Elixir - O herói volta para casa com o "elixir", e o usa para ajudar todos no mundo comum.
Para mais detalhes, podem consultar esta ligação. Como exercício, propunha que pegassem no vosso filme ou livro favorito e tentem ligar estes estágios com o que acontece. E deixo o desafio de encontrarem histórias que não sigam este paradigma.

sexta-feira, 20 de março de 2015

O Poeta - Parte 2 de 2

Podem ler a primeira parte aqui.


Os olhares não duraram mais do que um doloroso par de segundos. Já os jovens haviam perdido o interesse nele há alguns momentos e o coração ainda batia descompassado.
Vagueou ao acaso, tentando absorver o máximo desta realidade. As novas bandeiras faziam-lhe confusão. Ardia em curiosidade para saber o que acontecera, mas tinha receio de, ao perguntar, ser tomado como estrangeiro. Para além disso, não conversara com ninguém durante mais de uma década.
Recordou-se da última vez em que trocara impressões com o filho. Fora algures no início da década de vinte. Como era normal, ele deixara-lhe o almoço numa travessa à entrada do sótão e batera na madeira sólida. Ao abrir a porta, depara-se com um jornal ao lado da refeição.
― Tiago!
Ele voltara atrás, de olhar surpreendido.
― Obrigado pela comida ― agradeceu o idoso, acalmando-se.
― De nada, pai. Há alguma coisa de errado?
― Tiago, preferia que não me trouxesses jornais. Não me quero distrair com essas coisas. Quero conseguir concentrar-me totalmente na escrita.
― Desculpe, pai, não volta a acontecer ― ripostou o homem de meia-idade, voltando costas e desaparecendo sem esperar por uma resposta.
Depois do 11 de Setembro e do clima de Guerra Fria instalado contra um inimigo invisível e inventado pelos soberanos, Manuel perdera o interesse nas notícias. Os jornais diziam todos os dias o mesmo, interesses e interesses, excepto os seus.
Algo atraiu a sua atenção. Do outro lado da estrada havia uma livraria. Sem pensar duas vezes, atravessou a antiga faixa de rodagem, agora coberta com calçada portuguesa, e entrou no estabelecimento. Esforçou-se para mostrar um tom neutro enquanto procurava com o olhar a secção de História.
― Muito bom dia ― cumprimentou-o o lojista.
O coração falhou-lhe uma batida. Não esperava ser interpelado tão prontamente. O sotaque era-lhe familiar, mas não o que esperava de um habitante da Invicta.
― Bom dia.
O empregado, quase tão velho como ele, franziu o sobrolho.
― Em que posso ajudá-lo?
― Tem algum volume da história recente de Portugal?
O comerciante arregalou os olhos, como se tivesse acabado de ouvir algo escandaloso.
― Desculpe, mas não temos nenhum livro desse género.
Pela segunda vez nesse dia, o maxilar descaiu-lhe. Nunca antes havia estado numa livraria em que não houvesse uma secção inteira dedicada ao tema.
― Podia ter a bondade de me indicar onde se situa a prateleira de História?
Sem mais uma palavra, o homem apontou para um dos cantos da loja. Manuel mancou até lá, sem se atrever a quebrar o silêncio. De toda a estante, só metade de uma prateleira é que era dedicada a História. As lombadas não deixavam margem para dúvidas, Portugal já não existia. Nenhum livro do quarteirão disponível abordava outro assunto que não fosse a História de Porto e Galiza.
Abandonou o estabelecimento sem sequer agradecer. Procurou regressar a casa pelo mesmo caminho, precisava de retornar ao seu refúgio. Concentrado em colocar uma perna à frente da outra sem forçar demasiado os joelhos, não reparou nos dois homens que se aproximavam.
A colisão atirou-o ao chão. Os óculos saltaram e a visão ficou turva. Os dois vultos permaneciam à sua frente.
― Peço imensa desculpa ― amenizou, enquanto os dedos procuravam os óculos.
Sentiu a haste com o dedo mindinho. Puxou a armação e colocou-a sobre o nariz, recuperando a sua visão normal. Como duas torres, os dois homens vestidos com um fato quase tão antigo como o seu, observavam-no com ar de poucos amigos.
― Mostre-nos a sua identificação ― exigiu o mais alto.
― Não tenho nada ― balbuciou a tremer.
― Então vai ter que nos acompanhar até à Direcção Regional dos Assuntos Internos. Vá levante-se ou temos que o arrastar à força? ― rugiu um deles, estendendo a mão e agarrando-o pelo colarinho.
Os dois agentes conduziram-no à bruta pelas ruas até chegarem ao que Manuel recordava ser uma antiga esquadra da PSP. Sem cerimónias ou explicações, fecharam-no numa das celas.
***
Sentado na cadeira e apoiado na bengala, Manuel esperava que Tiago regressasse à cozinha. Quando este transpôs a entrada, recebeu-o com um olhar de cachorro submisso.
― Desculpa…
O filho fitou-o com uma expressão indecifrável, suspirando de seguida.
― Não percebo, juro que não percebo! ― exasperou-se, abanando a cabeça.
― Eu estava bloqueado, não escrevia nada há dias…
― Mas sair assim de casa? Sem sequer avisar? Os tempos mudaram, o nosso país já não é o mesmo. Não se pode andar pela rua sem os documentos. Aliás, o pai não pode sequer abrir a boca que vão notar que tem um sotaque diferente. O pai passou demasiado tempo fechado naquele sótão. Outra coisa que não percebo ― despejou, acabando por se sentar em frente ao pai, ofegante, como se tivesse realizado um grande esforço físico.
― Eu queria criar a maior obra da língua portuguesa…
― Essa língua já não existe, pelo menos deste lado do Mondego. Nunca devia ter permitido que passasse tanto tempo trancado naquele cubículo!
Os olhares cruzaram-se, o de um velho cansado e de um quarentão zangado.
― Valeu a pena? ― perguntou o filho.
― Como? ― admirou-se Manuel, arregalando os olhos.
― Conseguiu escrever a obra que tanto ansiava?
O idoso fitou a ponta dos sapatos, sem se atrever a levantar a cabeça.
― Não ― confessou uns momentos depois. ― E acho que nunca a irei terminar. Queria honrar uma nação que já não existe. Não só a nível soberano, territorial ou linguístico, mas aquela ideia que permaneceu durante mais de 800 anos, de um país uno que deu novos mundos ao mundo. Sem isso não vale sequer a pena terminar.
A tremer, levantou-se da cadeira, quase num esforço sobre-humano. A velhice apoderara-se dele. Olhou o filho e deu-lhe o seu melhor sorriso. Abraçaram-se por fim.
― Desperdicei vinte anos da minha vida por isto. Devo ser o maior idiota que existe mas, pelo menos, aprendi a minha lição. Espero que me perdoes…
A expressão de Tiago deixou-o mais sossegado. Não eram necessárias palavras. Depois encaminhou-se para o seu sótão, disposto a queimar tudo, até à última folha.